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Esse tal de Normcore

Esse tal de Normcore

Postado por em nov 20, 2014 em Blog, Moda, Tendências | 4 comentários

Em outubro de 2013, a Box 1824 e a K-Hole divulgaram um estudo definindo uma nova tendência de comportamento no consumo, o Normcore. Tais empresas ficam de olho em novidades socioculturais que despontam, sinalizando caminhos que em breve serão seguidos por todo mundo. O Normcore, no caso, é  “a atitude de transcender a diferenciação industrial em vez de contrapô-la”. Ou seja, abraçar o que é popular, sem se submeter a ele, sem se preocupar em ser mais um, mas sem perder a identidade. É não ter medo de estar com todo mundo, de ser normal.

Outra definição muito vista por aí é “a moda de Seinfeld”, que até virou meme, em referência ao estilo básico, normal, dos personagens da série sobre o nada. A moda sobre o nada?

Pouco mais de um ano depois, passada a edição de inverno 2015 do São Paulo Fashion Week, vimos pipocar matérias falando sobre isso, mais de um estilista declarando que o Normcore foi a referência de sua coleção e fashionistas descrevendo o look do dia como sendo da tendência. Ou seja, o que antes era um papo teórico, agora atingiu o que consumimos.

Por isso, nesse post, pretendo explicar o que é esse tal de Normcore e permear com a minha opinião. O que mais tenho visto na imprensa nacional são guias de como se vestir na tendência. Assim como o pessoal da Box, acho que é mais do que um modismo da indústria, é algo comportamental, portanto mais abrangente. E mais forte do que parece, por isso, relevante.

Como o Normcore se formou

Vejo que alguns pontos culturais e de comportamento se encontraram, unindo pessoas que antes estavam em diferentes esferas da sociedade, em um mesmo movimento, com atitudes e gostos em comum.

Anos 90, the come back:
O primeiro ponto foi o retorno dos anos 90. A indústria se alimenta do passado para nos fazer consumir. Fato. Não dá para ser tão original assim temporada após temporada. Então, quando distância suficiente é tomada, para bater aquela nostalgia, quando já há uma geração que não viveu aquela década consumindo, ela volta. Pronto. E aquela foi a década dos garotos suburbanos, dos amigos que dividiam apartamento, dos roqueiros de garagem, do estilo das ruas, do moletom, da flanela e do tênis. A única coisa que parecia separar os ídolos de seus fãs era a fama.

Outra vertente dos anos 90, a estética minimalista encontra campo fértil agora para crescer. Após um período em que cada um procurava sua individualidade e assim se expressava de forma a se destacar na multidão, as pessoas parecem cansadas de excessos. O minimalismo, mais neutro e clean, é perfeito para construir uma imagem mais normal. Chega de logos, estampas, ostentação ou expressão rebelde no look. Porém, a limpeza do visual não é uma atitude yuppie de aceitação do mainstream. O Normcore é uma atitude ambivalente, aceita o popular, mas não se submete a ele, é mais um posicionamento de deixar de lado a importância de se distinguir e ser apenas mais autêntico.
gisele Jil Sander 1999
*Gisele Bündchen na passarela de Jil Sander – verão/primavera 1999

Alguns exemplos práticos foram vistos na indústria da moda recentemente. Conhecidas pelo estilo coxinha a Abercrombie & Fitch e a Hollister Co., que são do mesmo grupo, anunciaram que irão estrategicamente reduzir os logos de suas roupas, após queda nas vendas no segundo quadrimestre deste ano. Na outra ponta, a hipster Urban Outfitters também foi obrigada a rever seus produtos por conta do mesmo motivo. A marca passa pelo segundo trimestre de perdas e vem sofrendo um revés de imagem após abusar de seu caráter ousado. Camisetas com frases do tipo “coma menos”, e um moletom com o emblema da Universidade de Kent e respingos de sangue, fazendo alusão a um massacre ocorrido na instituição em 1970, vêm causando aversão a seus consumidores.

Não temos mais idade, nem gênero:
A estética minimalista também se casa com outras duas ~tendências~ galopantes. Ou melhor, como eu prefiro ver, duas barreiras que caíram: gênero e idade. Cada vez mais, o que fazemos, consumimos e usamos não é mais determinado por padrões de gênero ou idade. Eu posso usar a mesma roupa do meu irmão ou da minha avó e vice-versa e reversa. Temos visto diversas manifestações nesse sentido, inclusive publicitárias. Sobre o tema gênero, até EU já fiz post hahahaha. Já a idade, quem se importa com isso? A geração Y ouve música do Pharrell Willians, 41 anos, os baby boomers leem a Tavi Gevinson, 18 anos. E todos nós idolatramos a Jessica Lange.
jessica lange
*Jessica Lange em campanha publicitária da linha de maquiagens de Marc Jacobs

Uniqlo_Spring_2015
*Imagem do lookbook de primavera/2015 da marca japonesa Uniqlo: meninas e meninos podem trocar os looks

The unfashion:

Assim como os ultrapassados tutoriais de etiqueta, a seção de “certo e errado” de uma revista de moda não tem mais muita força. Nos últimos anos, a moda tem estado menos engessada por mandamentos das passarelas, enquanto a voz das ruas tem ganhado indiscutível relevância. Dessa forma, o estilo próprio e original nunca foi tão verdadeiro. Mas houve tanta ânsia por buscar uma diferenciação, que surgiram estéticas superpoluídas e vazias de sentido. A facilidade de troca e acesso à informações também alimentou esse processo. Hoje, qualquer um copia qualquer um, inclusive as grandes marcas. Assim, o visual alternativo já vem empacotado e pronto para ser comprado. Não tem mais nada de alternativo nisso. E pode até levar a sérios casos de problemas de interpretação – vide o que aconteceu com a Urban Outfitters. Isso fez com que surgisse uma vontade de ir contra a corrente da diferenciação. Ninguém mais quer agir ou parecer muito “malucão”. Se montar todo parece um grito desesperado por atenção.

O minimalismo, portanto, se torna a forma estética confortável, ou viável, que se encaixa em todos esses aspectos. E o popular deixa de ter caráter pejorativo, de medíocre, ordinário, insosso, para ser apenas aquilo que todos gostam, independente de idade, sexo, nacionalidade.

Conclusão:
Normcore é a atitude de transcender a diferenciação industrial em vez de contrapô-la. Não é se misturar e se dissolver. É ter empatia e conectividade. Criamos vínculos quando temos gostos em comum. Normais. Eu estou de acordo com a definição da Box e da K-Hole: “Normcore se distancia de uma noção de cool baseada na diferença e adota um modelo de pós-autenticidade que opta pela igualdade. Porém, ao invés de se apropriar de uma versão estereotipada do mainstream, faz bom uso de cada situação presente. Para ser verdadeiramente Normcore, é preciso entender que o normal na verdade não existe. (…) A individualidade já foi uma promessa de liberdade pessoal — uma forma de viver a vida nos seus próprios termos. Entretanto, esses termos foram ficando tão específicos que acabamos nos isolando. A ideia de Normcore busca uma liberdade proveniente da não-exclusividade. É a libertação em não ser tão especial e o entendimento de que só a adaptabilidade leva ao pertencimento”.

Normcore na moda
Um dos trabalhos mais emblemáticos que vi foi um editorial da Revista Hot and Cool N. 5 (primavera 2013) feito com fotos do Google Street View. Um tapa na cara dos blogs de street style. Isso sim é a coisa real. Gente com roupas legais, de verdade, na rua.

Se você gosta de moda e tem prazer em montar um look, isso significa só uma coisa: tudo bem usar o que você quiser e também, pelo amor de Deus, algo que seja “sem marca” ou não pareça tirado do armário da Anna Dello Russo. Ainda assim, sair com uma calça jeans e um moletom pode ser gostoso, mas demonstrar estilo é usar peças com bom caimento, é deixar com a sua cara, dobrar uma barrinha, adicionar um colar, colocar um sapato diferente, deixar mais bonito. Por que o que é bonito e interessante vai continuar sendo bonito e interessante até o fim dos tempos, não importa a tendência. Sobretudo, é levar em conta a velha máxima de Coco Chanel “A moda sai de moda, o estilo não”. A GAP fez uma ótima campanha aproveitando o Normcore, afinal, os neutros e os básicos deixam sua personalidade brilhar. E esse filme diz muito:

E para os que gostam de ver umas peças de roupas bem combinadas, seguem os três looks que fizeram mais sucesso no meu painel Normcore do Pinterest.

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Fotos: Marc Jacobs, intothegloss.com, Harpers Bazaar/Diego Zuko, Uniqlo

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    4 Comentários

  1. Normcore, dress down, and we are back to basics <3

    • Iéié <3

  2. Adorei saber, com profundidade, de que se trata esse Normcore. E não é que me identifico com ele!

    • Adorei saber que você se identifica. Volte aqui sempre. Fico muiiiiito feliz em ter feedbacks rs <3

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